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Resumo: O presente trabalho analisa o Direito de prioridade, sua distinção com o requisito da novidade e como o direito brasileiro vigente regula a existência de depósitos de pedidos de patente de invenção reivindicando objetos com escopo colidente.
Citação: Covre, Rodolfo Guimarães; Patentes de invenção: o direito de prioridade, o requisito de novidade e a existência de depósitos com reivindicação de objetos com escopo colidente. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Faculdade de Direito. São Paulo – SP. · jan de 2016
1. Introdução
Gama Cerqueira, em seu Tratado da Propriedade industrial Volume II, Tomo I Parte II, realiza a seguinte reflexão, inspiração primária para o desenvolvimento deste projeto: “O simples depósito do pedido de patente, tal como se acha regulado, não deveria prejudicar a novidade da invenção, porque esse ato não importa a divulgação da invenção e seu conhecimento público, permanecendo, até a publicação dos pontos característicos (Código, art. 26), no recesso da repartição, que não fornece certidões das peças que instruem o pedido. Mesmo essa publicação não implica necessariamente a divulgação do invento, porque se limita aos pontos característicos, os quais, muitas vezes, são insuficientes para o completo conhecimento da invenção. Há, finalmente, os casos em que a invenção é deficiente ou erradamente descrita no memorial que acompanha o pedido, não podendo, desse modo, constituir anterioridade oponível à novidade de outra invenção objeto de pedido posteriormente depositado. O pedido de patente para a mesma invenção feito anteriormente impedirá, sem dúvida, a concessão do privilégio posteriormente requerido, não, porém, porque o primeiro depósito prejudique a novidade da invenção, mas porque estabelece prioridade para a concessão da patente, em favor do primeiro depositante. É uma questão de prioridade, ou de autoria de invenção, e não de novidade. No caso, porém, de ser indeferido o pedido anteriormente depositado, qual a conseqüência? Ao nosso ver, a questão deve ser resolvida de acordo com as circunstâncias de fato, considerando-se prejudicada a novidade da invenção sempre que do depósito anterior resulte o seu conhecimento. Não havendo divulgação, a novidade não sofre a influência desse ato.” O presente trabalho analisa o Direito de prioridade, suas relações e distinções com o requisito da novidade e como o direito brasileiro vigente regula a existência de depósitos de pedidos de patente de invenção reivindicando objetos com escopo colidente.
Como fonte primária de direito sobre as patentes de invenção, verificamos o disposto na Constituição Federal de 1988:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXIX – a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País;”
A propriedade é posta assim na condição de direito fundamental em nossa constituição. A sua espécie mais recente, a propriedade intelectual, vem também ser assegurada explicitamente no Art. 5º, inciso XXIX da CF. Particularmente no que tange as patentes de invenção, verifica-se o direito aos autores de inventos industriais ao privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais. Os bens imateriais, cada vez mais valorizados na sociedade atual, trazem consigo um arcabouço de fundamentos e conceitos que muitas vezes são de difícil compreensão pelo operador do direito. Tratar-se-á aqui de um conceito bastante específico, o instituto da prioridade.
2. O direito de prioridade nas patentes de invenção
A Convenção União de Paris (CUP) para a proteção de propriedade intelectual foi assinada originalmente em 20 de Março de 1883 e o Brasil tornou-se membro desta norma pela promulgação em 28 de junho de 1884, pelo Congresso Nacional (1). A convenção trouxe em sua estrutura grandes avanços para a propriedade intelectual como o tratamento nacional, o direito de prioridade e diversas regras comuns para harmonização entre os países membros. Diversas foram as modificações introduzidas no texto de 1883, através de suas 7 revisões. Na primeira, em Roma, os atos assinados não foram ratificados por nenhum país. Seguiram-se as Revisões de Bruxelas (1900), Washington (1911), Haia (1925), Londres (1934), Lisboa (1958) e Estocolmo (1967). O Brasil aderiu à Revisão de Estocolmo em 1992. (2)
O Direito de Prioridade disposto nesta convenção, artigo 4º, estabelece que aquele que tiver feito regularmente o depósito de um pedido de privilégio de invenção, de desenho ou modelo industrial, de uma marca de fábrica ou de comércio, em um dos Estados ou Autoridades contratantes, gozará, para efetuar o depósito nos outros Estados, e sob reserva dos direitos de terceiros, de um direito de prioridade durante os prazos determinados (3).
Subsequentemente, o Congresso Nacional aprovou pelo Decreto Legislativo nº 30, de 15 de dezembro de 1994, a Ata Final que Incorpora aos Resultados da Rodada Uruguai de Negociações Comerciais Multilaterais do GATT, assinada em Maraqueche, em 12 de abril de 1994. Denominado acordo sobre aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio, ou abreviadamente, TRIPS (em sua designação em inglês), carrega em seu artigo 2º a obrigatoriedade de seus membros cumprirem com o disposto nos Artigos 1 a 12, e 19, da Convenção de Paris (1967). Inclui assim o Direito de Prioridade.
Estas regras trouxeram enorme organização para o sistema de propriedade intelectual, que se firma até hoje no sistema jurídico vigente no Brasil. É disciplinado, além de nos tratados acima citados e incorporados por Decretos ao nosso direito pátrio, na Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996, Lei da Propriedade Industrial (LPI).
Os Arts. 16 e 17 da LPI tratam do direito de prioridade para os estrangeiros e para os nacionais, respectivamente:
“Art. 16. Ao pedido de patente depositado em país que mantenha acordo com o Brasil, ou em organização internacional, que produza efeito de depósito nacional, será assegurado direito de prioridade, nos prazos estabelecidos no acordo, não sendo o depósito invalidado nem prejudicado por fatos ocorridos nesses prazos.”
“Art. 17. O pedido de patente de invenção ou de modelo de utilidade depositado originalmente no Brasil, sem reivindicação de prioridade e não publicado, assegurará o direito de prioridade ao pedido posterior sobre a mesma matéria depositado no Brasil pelo mesmo requerente ou sucessores, dentro do prazo de 1 (um) ano.” (4)
Adicionalmente, figura na LPI outro dispositivo, o da retirada do pleito à propriedade intelectual, que estabelece o direito de prioridade quando da retirada de um pedido de patente e disciplinado nos seguintes artigo>
“Art. 7º Se dois ou mais autores tiverem realizado a mesma invenção ou modelo de utilidade, de forma independente, o direito de obter patente será assegurado àquele que provar o depósito mais antigo, independentemente das datas de invenção ou criação.
Parágrafo único. A retirada de depósito anterior sem produção de qualquer efeito dará prioridade ao depósito imediatamente posterior.”
“Art. 29. O pedido de patente retirado ou abandonado será obrigatoriamente publicado.
§ 1º O pedido de retirada deverá ser apresentado em até 16 (dezesseis) meses, contados da data do depósito ou da prioridade mais antiga.
§ 2º A retirada de um depósito anterior sem produção de qualquer efeito dará prioridade ao depósito imediatamente posterior.”
Bem define Gama Cerqueira, sobre o cenário acima, esclarecendo que: “Não se pode, também, falar em colaboração quando duas pessoas, sem prévio entendimento, dedicam seus esforços à mesma invenção e chegam a resultados idênticos. Nesse caso, não há invenção comum, mas apenas uma questão de prioridade a ser resolvida, não podendo nenhum dos inventores pretender qualquer participação na invenção do outro ou nos resultados parciais a que tiver chegado. Na hipótese, o direito à patente caberá ao inventor que primeiro a requerer.” (5)
2.1 Elementos
O direito de prioridade contém como elementos uma data, referida como data de prioridade, e um objeto, referido como objeto de prioridade.
Especificamente sobre a data de prioridade, temos um critério objetivo para o estabelecimento do início do direito e seus prazos relacionados. Definem os tratados internacionais e a LPI que será assegurado direito de prioridade, no prazo de 12 (doze) meses, não sendo o depósito invalidado nem prejudicado por fatos ocorridos nesses prazos. A contagem de seu termo considera que se o último dia do prazo for feriado legal ou dia em que Repartição não se encontre aberta para receber a apresentação dos pedidos no país em que a proteção é requerida, o prazo será prorrogado até o primeiro dia útil seguinte. (6)
Sobre o objeto de prioridade duas vertentes são discutidas. Uma que define que a extensão do objeto deve referir-se ao conteúdo compreendido nas reivindicações (7), outra que a extensão do objeto deve referir-se ao conteúdo completo do pedido de patente. A legislação brasileira parece estabelecer pela segunda opção, em harmonia ao previsto na CUP. (8)
“Art. 11. A invenção e o modelo de utilidade são considerados novos quando não compreendidos no estado da técnica.
§ 2º Para fins de aferição da novidade, o conteúdo completo de pedido depositado no Brasil, e ainda não publicado, será considerado estado da técnica a partir da data de depósito, ou da prioridade reivindicada, desde que venha a ser publicado, mesmo que subseqüentemente.”
Gama Cerqueira neste ponto estabelece que: “O simples depósito do pedido de patente, tal como se acha regulado, não deveria prejudicar a novidade da invenção, porque esse ato não importa a divulgação da invenção e seu conhecimento público, permanecendo, até a publicação dos pontos característicos (Código, art. 26), no recesso da repartição, que não fornece certidões das peças que instruem o pedido.”. Continua ensinando que “O pedido de patente para a mesma invenção feito anteriormente impedirá, sem dúvida, a concessão do privilégio posteriormente requerido, não, porém, porque o primeiro depósito prejudique a novidade da invenção, mas porque estabelece prioridade para a concessão da patente, em favor do primeiro depositante. É uma questão de prioridade, ou de autoria de invenção, e não de novidade.”. Assim, entende-se que por mais que o texto legal compreendido no Art. 11, §2º refira-se à novidade, trata-se formalmente de uma questão de prioridade. Ninguém poderia esclarecer melhor esta questão que o saudoso Dr. Gama Cerqueira.
Verifica-se também que o conteúdo completo de pedido depositado no Brasil, e ainda não publicado, será considerado estado da técnica a partir da data de depósito. Ou seja, nos casos onde haja colidência de objetos reivindicados no Brasil, terá a prioridade sobre o conteúdo pleiteado aquele que detiver a prioridade mais antiga, conforme será detalhado adiante.
2.2 Requisitos de validade
Define a Convenção União de Paris que Art. 4º, itens 1 a 3 que aquele que tiver devidamente apresentado pedido de patente de invenção, gozará, para apresentar o pedido nos outros países, dos direito de prioridade durante os prazos fixados. Reconhece-se como dando origem ao direito de prioridade qualquer pedido de patente com valor de pedido regular nacional, em virtude da legislação nacional de cada país da União ou de tratados bilaterais ou multilaterais celebrados entre os países da União. Deve-se entender-se por pedido regular nacional qualquer pedido efetuado em condições de estabelecer a data em que o mesmo foi apresentado no país em causa, independentemente do resultado ulterior do pedido. Neste sentido vem suplementar o ordenamento da CUP nossa Lei de propriedade Industrial em seu Artigo 19:
“Art. 19. O pedido de patente, nas condições estabelecidas pelo INPI, conterá:
I – requerimento;
II – relatório descritivo;
III – reivindicações;
IV – desenhos, se for o caso;
V – resumo; e
VI – comprovante do pagamento da retribuição relativa ao depósito.”
Ou seja, para a validade formal do direito de prioridade basta o depósito de um pedido de patente compreendendo a petição regularmente preenchida, o conteúdo do pedido de patente compreendendo relatório descritivo, reivindicações e resumo, e, o pagamento da retribuição relativa ao depósito devidamente comprovada junto ao INPI.
Cabe aqui discussão sobre o requisito de validade do objeto de prioridade. Seria válido o objeto de prioridade para um pedido de patente que descreva conceito que não tenha sido realizado no plano material ou que não seja possível de ser realizado por um técnico no assunto na data de seu depósito? Suponhamos que seja descrito no relatório descritivo um dispositivo de propulsão de veículo à velocidade da luz, onde a única descrição do objeto seja uma figura do dito dispositivo compreendendo elemento chamado de “motor para propulsão até a velocidade da luz” e ausente de especificação tecnológica adicional (e.g., detalhamento do dito motor, seus componentes ou mesmo seu processo de funcionamento). Um cenário comum encontrado na jurisprudência administrativa nos escritórios de patentes é de um pedido de patente anterior descrevendo um projeto de pesquisa ou a mera descrição do objeto, ausente de fundamentação factual de que aquilo que se descreve efetivamente se materializa ou funciona. Subsequentemente, apresenta-se dentro o prazo de 12 meses para reivindicação do direito de prioridade, um pedido de patente subsequente, reivindicando sua prioridade, e compreendendo o mesmo objeto, mas acrescido da fundamentação factual suficiente para comprovar que o objeto anteriormente descrito efetivamente funcionava.
Separa-se aqui, para fins de organização, o objeto de prioridade em dois subelementos, o objeto formal de prioridade e o objeto material de prioridade.
O objeto formal de prioridade é constituído pelo conteúdo completo do pedido de patente, conforme bem define a LPI. É aquilo que se encontra escrito formalmente, sem análise de seu mérito e fornece uma fundamentação objetiva sobre aquilo que se entende como o escopo do objeto de prioridade. Inquestionável, pelos fundamentos jurídicos acima apresentados que o depósito válido de um pedido de patente confere ao seu detentor direito de data de prioridade e o sobre o objeto formal de prioridade.
O objeto material do direito de prioridade é o passível de análise de mérito e é fundamento, a nosso ver, de validade sobre todo o direito de prioridade. Entra no requisito mais criterioso sobre o que seria um “pedido de patente de invenção devidamente apresentado”, ou “pedido de patente de invenção regular nacional” nos termos requeridos pela CUP. Vem a LPI socorrer sobre o que considera condição ao pedido de patente, em seu Artigo 24:
“Art. 24. O relatório deverá descrever clara e suficientemente o objeto, de modo a possibilitar sua realização por técnico no assunto e indicar, quando for o caso, a melhor forma de execução.”
Assim, podemos estabelecer que ausente uma descrição clara e suficiente do objeto, de modo a possibilitar sua realização por técnico no assunto, carecerá um dos requisitos que suporta o direito em si. Em outras palavras, carece o fundamento do direito de privilégio temporário, patente de invenção (9), e consequentemente o direito de prioridade, assessório a este.
3. O requisito de novidade nas patentes de invenção
Diversos são os requisitos para a concessão de uma patente de invenção, definindo a melhor doutrina que primeiramente, e antes de análise de qualquer requisito legal para sua concessão, deve-se aferir se há invenção (10). Os requisitos de patenteabilidade, definidos em nossa lei são a novidade, atividade inventiva e aplicação industrial e passaram por ampla evolução em nosso ordenamento jurídico. Entendemos não caber ao escopo deste trabalho de conclusão de curso trazer à tona detalhamentos deste histórico, mas trataremos aqui o direito posto e as análises compreendidas nas bibliografias levantadas sobre o tema. Assim, entende-se como uma das fontes de direito do requisito de novidade o TRIPS, estabelecendo em sua seção 5, Patentes:
“ARTIGO 27 – Matéria Patenteável
1. Sem prejuízo do disposto nos parágrafos 2 e 3 abaixo, qualquer invenção, de produto ou de processo, em todos os setores tecnológicos, será patenteável, desde que seja nova, envolva um passo inventivo e seja passível de aplicação industrial. Sem prejuízo do disposto no parágrafo 4 do Artigo 65, no parágrafo 8 do Artigo 70 e no parágrafo 3 deste Artigo, as patentes serão disponíveis e os direitos patentários serão usufruíveis sem discriminação quanto ao local de invenção, quanto a seu setor tecnológico e quanto ao fato de os bens serem importados ou produzidos localmente.” (11)
A legislação brasileira confirma essa disposição definindo que é patenteável a invenção que atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial (12). Sobre o requisito de novidade, detalha que:
“Art. 8º É patenteável a invenção que atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.”
“Art. 11. A invenção e o modelo de utilidade são considerados novos quando não compreendidos no estado da técnica.
§ 1º O estado da técnica é constituído por tudo aquilo tornado acessível ao público antes da data de depósito do pedido de patente, por descrição escrita ou oral, por uso ou qualquer outro meio, no Brasil ou no exterior, ressalvado o disposto nos arts. 12, 16 e 17.
§ 2º Para fins de aferição da novidade, o conteúdo completo de pedido depositado no Brasil, e ainda não publicado, será considerado estado da técnica a partir da data de depósito, ou da prioridade reivindicada, desde que venha a ser publicado, mesmo que subseqüentemente. (13)
§ 3º O disposto no parágrafo anterior será aplicado ao pedido internacional de patente depositado segundo tratado ou convenção em vigor no Brasil, desde que haja processamento nacional.”
A aferição do estado da técnica para o requisito de novidade é entendida como critério objetivo de levantamento bibliográfico de todo e qualquer documento que revele integralmente, e dentro da mesma fonte, ao menos um dos objetos reivindicados do pedido de patente. Conforme a lei dispõe, constitui documento válido para ser enquadrado como estado da técnica a descrição escrita ou oral, por uso ou qualquer outro meio, no Brasil ou no exterior, subentendendo-se aqui que este documento também possa estar descrito em qualquer língua. Podemos subdividir em quatro categorias os documentos que podem vir a prejudicar a novidade de um pedido de patente de invenção. (14)
O primeiro é o pedido de patente ainda não publicado quando da data de depósito ou da data de prioridade do pedido de patente em exame e com data de depósito anterior ao mesmo.
O segundo é a patente concedida e ainda não publicada quando da data de depósito ou da data de prioridade do pedido de patente em exame e com data de depósito posterior ao mesmo.
Entende-se que, segundo a lei, que tanto no primeiro quanto no segundo cenário deve-se analisar a novidade conforme estabelece os § 2º e 3º do Art. 11 da LPI, ou seja, o conteúdo completo de pedido depositado no Brasil, e ainda não publicado, será considerado estado da técnica a partir da data de depósito, ou da prioridade reivindicada, inclusive em pedido de patente internacional depositado segundo tratado ou convenção em vigor no Brasil, desde que haja processamento nacional. (15)
O terceiro é o pedido de patente ou patente e já tornado público quando da data de depósito ou da data de prioridade do pedido de patente em exame.
O quarto é documento que comprove descrição escrita ou oral, por uso ou qualquer outro meio, no Brasil ou no exterior com data de publicação anterior ao da data de depósito ou da prioridade do pedido de patente em exame. (16)
Para o terceiro e quarto cenário considera-se que ambos documentos são estado da técnica em sua acepção mais comum, assim, exaurindo a novidade de eventual pleito colidente sem necessidade de análises mais profundas.
Conforme acima definido, para que tratemos da novidade, o documento deve revelar ao menos um dos objetos pleiteados nas reivindicações do pedido de patente em exame. Pode existir o cenário de um pedido de patente compreender uma reivindicação 1 ausente de novidade, mas uma reivindicação 2, distinta, cumprindo com tal requisito. Detalharemos este ponto adiante.
4. Sobre as reivindicações e o escopo do direito de impedir terceiros
As reivindicações são seção fundamental ao entendimento do objeto jurídico o qual se pretende proteção por patente. É a reivindicação que delimita objetivamente o escopo da propriedade intelectual e que define também o escopo daquilo que deve ser examinado durante o processo de concessão de um pedido de patente (17). Neste sentido, vem definir a LPI:
“Art. 41. A extensão da proteção conferida pela patente será determinada pelo teor das reivindicações, interpretado com base no relatório descritivo e nos desenhos.”
Art. 42. A patente confere ao seu titular o direito de impedir terceiro, sem o seu consentimento, de produzir, usar, colocar à venda, vender ou importar com estes propósitos:
I – produto objeto de patente;
II – processo ou produto obtido diretamente por processo patenteado.”
Assim, podemos definir com clareza e em conformidade com os ensinamentos de Gama Cerqueira que todas as invenções visam a um destes fins: criar novos produtos ou objetos materiais, ou criar novos processos para se obter determinados efeitos, os quais podem tanto concretizar-se em um corpo ou objeto material (produto), como manifestar-se em um simples estado de coisas (resultado) (18). Logo, os objetos da proteção pleiteados devem definir objetivamente um produto, compreendendo todas as características de produto que o caracterizam, ou um processo, compreendendo todas as etapas ou parâmetros processuais que permitem que se parta de um determinado contexto e se chegue até o final do dito processo, obtendo o produto final ou seu resultado alcançado. (19)
As reivindicações podem ser em uma ou mais e constitui vinculação de ser examinada pela repartição pública, uma a uma, quanto aos requisitos de concessão. Ou seja, cada reivindicação, e seu objeto, será dividido objetivamente em suas características técnicas essenciais e comparado com o estado da técnica. Havendo colidência entre todas as características técnicas compreendidas em uma reivindicação com o revelado em um único documento do estado da técnica deve-se concluir pela ausência de novidade desta reivindicação. Parte-se assim para a aferição da reivindicação subsequente, se houver, que também pode conter ou não nova característica técnica. Havendo uma única distinção técnica entre aquilo que é definido na reivindicação subsequente e aquilo revelado no documento do estado da técnica, deve-se concluir pela novidade do objeto reivindicado. Parte-se assim para análise dos requisitos subsequentes, podendo, no caso de estarem todos preenchidos, ser declarado o deferimento do pedido de patente. (20)
A interpretação das reivindicações deve ocorrer em conjunto com a seção do relatório descritivo e das figuras, casa existam. Recomenda-se assim que se evite realizar uma interpretação literal do objeto definido nas reivindicações do pedido de patente. Em outras palavras, a análise do escopo de uma reivindicação de um pedido de patente deve ser sistemática, englobando a leitura do conteúdo completo do pedido de patente.
A lei estabelece também que a patente concedida confere ao seu titular o direito de impedir terceiro, sem o seu consentimento, de produzir, usar, colocar à venda, vender ou importar com estes propósitos o produto objeto da patente e o processo ou produto obtido diretamente por processo patenteado. Deve-se estabelecer aqui uma distinção entre o privilégio do inventor e os monopólios de indústria ou de comércio, uma vez que o privilégio do inventor fornece um direito negativo de impedir terceiro, sem o seu consentimento, de produzir, usar, colocar à venda, vender ou importar, que, não deve ser confundido com o direito positivo de poder produzir, usar, colocar à venda, vender ou importar o produto ou processo objeto de patente concedida. Ou seja, outros direitos de terceiros, incluindo, mas não somente os de propriedade intelectual, podem existir dentro do escopo da patente em questão e onde se possua interesse de comercialização. (21) A lei vem conciliar então, cenário sui generis, que pode ocorrer na prática, onde existem duas patentes de invenção que compartilham mesmo “território”, que estão concedidas e válidas, e ambas compreendendo todos os requisitos, incluindo, a novidade, atividade inventiva e aplicação industrial. Vem estabelecer a LPI que:
“Art. 70. A licença compulsória será ainda concedida quando, cumulativamente, se verificarem as seguintes hipóteses:
I – ficar caracterizada situação de dependência de uma patente em relação a outra;
II – o objeto da patente dependente constituir substancial progresso técnico em relação à patente anterior; e
III – o titular não realizar acordo com o titular da patente dependente para exploração da patente anterior.
§ 1º Para os fins deste artigo considera-se patente dependente aquela cuja exploração depende obrigatoriamente da utilização do objeto de patente anterior.
§ 2º Para efeito deste artigo, uma patente de processo poderá ser considerada dependente de patente do produto respectivo, bem como uma patente de produto poderá ser dependente de patente de processo.
§ 3º O titular da patente licenciada na forma deste artigo terá direito a licença compulsória cruzada da patente dependente.”
Entende-se assim que há a conciliação entre o direito de privilégio temporário assegurado constitucionalmente aos autores de inventos industriais e o ordenamento constitucional de incentivo ao desenvolvimento científico, a pesquisa, a capacitação científica e tecnológica e a inovação. Entende-se assim que o direito negativo de impedir terceiro, sem o seu consentimento, de produzir, usar, colocar à venda, vender ou importar é limitado pela existência de outro direito negativo de impedir terceiro, contido neste. Ocorre uma exclusão mútua, que o direito vem bem a regular e estabelecer que deve haver a licença compulsória (22). Veremos alguns exemplos em seguida.
5. A existência de depósitos de pedidos de patente de invenção distintos e reivindicando objetos com escopos colidentes
Com base no anteriormente descrito, podemos partir para a situação de interesse de análise aprofundada em nosso trabalho de conclusão de curso. Estabeleceremos assim os cenários e hipóteses jurídicas quando da existência de depósitos de pedidos de patente de invenção distintos, ou seja, contendo processos de concessão de pedidos de patente distintos, independente de serem de mesma pessoa ou de pessoas distintas, e reivindicando objetos com escopos colidentes.
Suponhamos, para fins práticos, que o escopo do objeto reivindicado por um pedido de patente de invenção “A” possa ser definido como a área de um quadrado dentro de um determinado campo técnico hipotético e com espaço finito sobre o conhecimento técnico que possa vir a ser reivindicado como propriedade intelectual. Define-se para todos os fins o campo técnico de estudo:
Figura 1: Campo técnico ausente de qualquer revelação ou propriedade intelectual.
Supõe-se também que não há nenhuma revelação prévia sobre o referido campo técnico por qualquer outro documento que não os aqui trazidos. Assim, apresenta-se o pedido de patente de invenção “A” devidamente depositado em repartição pública e que compreende duas reivindicações, denominadas de 1A e 2A. Seu relatório descritivo detalha suficientemente o conteúdo para fundamentar as reivindicações.
Figura 2: Escopo do objeto reivindicado no pedido de patente de invenção “A”
A figura acima apresenta a propriedade intelectual do pedido de patente de invenção como um todo, assim, compreendendo ambas as reivindicações representadas dentro de uma mesma figura. Para fins de clareza deste modelo de análise de pedidos de patente de invenção, devemos interpretar que a área da reivindicação 1A é circunscrita por todo o perímetro do quadrado 1A, bem como a área da reivindicação 2A é circunscrita por todo o perímetro do quadrado 2A. Ainda, devemos interpretar que quando a área de uma figura está compreendida no mesmo espaço da outra, que ambas revelam e reivindicam a mesma propriedade intelectual. A representação separada de cada reivindicação segue abaixo:
Figura 3: Representação esquemática do escopo do objeto reivindicado no pedido de patente de invenção “A” com a definição do escopo do objeto reivindicado de cada reivindicação isoladamente. A linha contínua deve ser entendida como linha limite do escopo da reivindicação em questão.
Definidas as premissas do modelo de análise que utilizaremos para aferição dos cenários, podemos prosseguir.
5.1. Quando o depósito do pedido de patente de invenção subsequente ocorre durante a fase de sigilo do pedido de patente de invenção anterior
Traremos para o presente cenário novo pedido de patente de invenção “B” que compreende como características formais possuir depósito válido em mesma repartição pública de “A”, data de depósito posterior ao do pedido de patente de invenção “A” e esta mesma data de depósito ser anterior à publicação do pedido de patente de invenção “A”. O pedido de patente de invenção “B” possui o seguinte escopo de objeto reivindicado, em comparação com “A” (23):
Figura 4: Escopo do objeto reivindicado em “A” e “B”.
Verifica-se aqui que há colidência entre os escopos dos objetos reivindicados de “A” e “B” no que concerne as reivindicações 1A, 2A, 1B e 2B. Não há colidência sobre a reivindicação 3B. Assim, neste cenário entendemos que o pedido de patente “A” possui prioridade sobre o objeto reivindicado 1A e 2A e deve ter tais reivindicações concedidas pela repartição pública. Não obstante, o pedido de patente “B” possui reivindicações em colidência com a propriedade de “A”. Vejamos o que ocorre com cada uma das reivindicações isoladamente.
A reivindicação 1B possui colidência com as propriedades 1A e 2A, não possui assim prioridade frente ao pedido de patente “A”. A reivindicação 2B também possui colidência com 1A e 2A, consequentemente, não possui prioridade frente ao pedido de patente “A”. A reivindicação 3B não possui colidência com qualquer reivindicação do pedido de patente “A”, assim, não é necessário se discutir a questão de prioridade (por ser a primeira a depositar o conteúdo em pedido de patente válido) e de novidade (por não conter estado da técnica revelando integralmente o conteúdo reivindicado). Assim, o seguinte cenário será encontrado quando da análise da propriedade intelectual sobre o campo técnico em questão. (24)
Figura 5: Propriedade intelectual de “A” e “B” concedida sobre o campo técnico.
5.2 Quando o depósito do pedido de patente de invenção subsequente ocorre após a publicação do pedido de patente de invenção anterior
Desconsiderando a existência do pedido de patente “B”, traremos para o presente cenário novo pedido de patente de invenção “C” que compreende como características formais possuir depósito válido em mesma repartição pública de “A”, data de depósito posterior ao do pedido de patente de invenção “A” e esta mesma data de depósito ser posterior à publicação do pedido de patente de invenção “A”. O pedido de patente de invenção “C” possui o seguinte escopo de objeto reivindicado, em comparação com o já publicado por “A”:
Figura 6: Escopo do objeto reivindicado em “A” e “C”.
Verifica-se assim que há colidência entre os escopos dos objetos revelados de “A” com o objeto reivindicado por “C” no que concerne as revelações em 1A e 1C. Não há colidência ou revelação sobre a reivindicação 2A e 2C. Assim, neste cenário, entendemos que o pedido de patente “A” possui data de depósito anterior sobre o objeto reivindicado 1C e deve possuir tais reivindicações concedidas pela repartição pública. Não obstante, o pedido de patente “C” possui reivindicação em colidência com o revelado e reivindicado por “A”. Vejamos o que ocorre com cada uma das reivindicações isoladamente.
A reivindicação 1C possui colidência com e revelado e reivindicado por 1A, não é assim dotada de novidade frente ao pedido de patente “A”. A reivindicação 2C não possui colidência com qualquer revelação ou reivindicação do pedido de patente “A”, assim, não é necessário se discutir a questão de prioridade (por ser a primeira a depositar o conteúdo em pedido de patente válido) e de novidade (por não conter estado da técnica revelando integralmente o conteúdo reivindicado). Assim, o seguinte cenário será encontrado quando da análise da propriedade intelectual sobre o campo técnico em questão.
Figura 7: Propriedade intelectual de “A” e “C” concedida sobre o campo técnico.
Certamente, o presente cenário requer que a haja a aferição sobre o requisito da atividade inventiva, verificando assim se o objeto reivindicado no pedido de patente “C” é dotado de atividade inventiva, para um técnico no assunto, não decorrendo de maneira evidente ou óbvia do estado da técnica, neste caso sobre o conteúdo revelado por “A”. Para fins meramente de discussão sobre o modelo acima proposto verifica-se que o objeto reivindicado 2C possui distância de “uma área” sobre o objeto revelado e reivindicado por “A”. Pode-se assim verificar que há certo distanciamento objetivo entre um conteúdo e outro. Assim, em princípio, pode-se subentender haver atividade inventiva. Podemos também inferir que, do ponto de vista lógico, prima facie, o objeto reivindicado por 2C possuiria maior atividade inventiva do que o conteúdo reivindicado por 3B, do exemplo anterior, caso ambos fossem depositados após a data de publicação do pedido de patente de invenção “A”. Caberia no caso concreto verificar se indícios secundários de patenteabilidade estão presentes e que possam alterar o entendimento prima facie acima inferido.
5.3. A questão da territorialidade
Define Jacques Labrunie que “há a possibilidade de coincidência internacional: um inventor estrangeiro (beneficiário da Convenção de Paris) realizou uma invenção e a depositou em seu país. A invenção não foi divulgada, e o pedido de patente não foi publicado, portanto, não há implicação quanto à novidade. Um outro inventor realiza a mesma invenção, pouco tempo depois, e deposita o pedido de patente no Brasil. Se aquele inventor que depositou primeiro no estrangeiro, dentro do período subseqüente de doze meses, previsto na Convenção de Paris, deposita, no Brasil, pedido de patente com reivindicação de prioridade de seu depósito no estrangeiro, seu direito retroage à data do depósito no estrangeiro. Assim, mesmo que tenha sido o segundo a depositar no Brasil, será o titular da patente no Brasil. Se, ao contrário, a patente for concedida ao primeiro a depositar no Brasil, porém em violação ao direito convencional de prioridade do estrangeiro, a patente será inválida.” (25) Este cenário, cada vez mais comum de ser encontrado na jurisprudência administrativa é bem regulado pelo direito de prioridade, conforme a CUP e a LPI dispõem.
Cenário também cada vez mais comum de ser encontrado é o de existir, um inventor estrangeiro que realizou uma invenção e a depositou em seu país. A invenção não foi divulgada, e o pedido de patente não foi publicado, e, um outro inventor, que realiza a mesma invenção, pouco tempo depois, e deposita o pedido de patente no Brasil antes de qualquer publicação do primeiro pedido de patente. Adiciona-se ao cenário que nem o estrangeiro nem o brasileiro estendam a proteção para país onde o outro requeira proteção. Nesta hipótese ambos os direitos coexistirão em seus respectivos países, sem prejuízo ao direito de prioridade muito menos ao requisito de novidade.
6. Considerações finais
Conforme vimos ao longo deste trabalho o direito de prioridade possui semelhanças e distinções com o direito de novidade. No contexto atual de intensa competitividade, focada na diversificação e estabelecimento de vantagens comerciais por meio da pesquisa, desenvolvimento e inovação, verifica-se cada vez mais a incidência de pedidos de patente com objetos com escopo colidentes. Espera-se que este trabalho possa ter trazido uma metodologia clara e eficaz sobre a propriedade intelectual das patentes de invenção e que auxilie na discussão objetiva sobre estes privilégios temporários.
Referências ao longo do texto:
(1) CERQUEIRA, João da Gama, pag. 13
(2) Cabeçalho Convenção União de Paris (CUP)
(3) CUP, Revisão de Estocolmo (1967), Art 4º
(4) O instituto constante no artigo 17, comumente chamado no Brasil de prioridade interna, estabelece a regulação do direito de prioridade quando o pedido de patente anterior e posterior é brasileiro. Entende-se aqui ser uma exceção à regra, como uma figura atípica sobre o direito de prioridade. Em nossa opinião vai contra os princípios da CUP, principalmente no tocante do tratamento nacional regulado pelo seu Art. 2º, uma vez que estabelece um direito de prioridade mais amplo ao estrangeiro do que ao depositante nacional, no tocante principalmente ao direito de múltiplas prioridades.
(5) CERQUEIRA, João da Gama Vol II. Tomo I. Pag 11 e 12
(6) CUP, Revisão de Estocolmo (1967), Art. 4º C . (1) Os prazos de prioridade acima mencionados serão de doze meses para invenções e modelos de utilidade e de seis meses para os desenhos ou modelos industriais e para as marcas de fábrica ou de comércio. (2) Estes prazos correm a partir da data da apresentação do primeiro pedido; o dia da apresentação não é contado. (3) Se o último dia do prazo for feriado legal ou dia em que Repartição não se encontre aberta para receber a apresentação dos pedidos no país em que a proteção é requerida, o prazo será prorrogado até o primeiro dia útil seguinte.
(7) BARBOSA, Denis Borges afirma na conclusão de seu artigo intitulado “Múltiplas prioridades e a necessidade de inclusão de todo material na reivindicação” (Setembro de 2011) “Assim, se a primeira prioridade alegada não está na reivindicação, ela não pode ser arguida.”.
(8) CUP – Revisão de Estocolmo (1967) – Art. 4º H – A prioridade não pode ser recusada com o fundamento de que certos elementos da invenção para os quais se reivindica a prioridade não figuram entre as reivindicações formuladas no pedido apresentado no país de origem, contando que o conjunto dos documentos do pedido revele de maneira precisa aqueles elementos.
(9) Em sua concepção mais abrangente define-se ser patente aquilo que não deixa dúvida; é claro, evidente. Não havendo revelação clara de uma invenção não há de se falar há patente de invenção. Em contrapartida, não haverá incidência sobre hipótese que fundamenta o direito ao privilégio temporário muito menos o direito de prioridade.
(10) Ensina CERQUEIRA, João da Gama que: “A noção de invenção privilegiável, entretanto, pressupõe forçosamente o conceito de invenção, pois privilegiável é a invenção que satisfaz aos requisitos legais de que depende a concessão do privilégio. A existência de invenção, portanto, constitui pressuposto essencial da aplicação da lei: se existe invenção, aplica-se a lei; se não existe, a lei não é aplicável. O direito do inventor nasce do fato da invenção e não se realiza sem esta. Desse modo, em face de um pedido de patente, é sempre necessário verificar, em primeiro lugar, se existe, realmente, invenção, no sentido técnico desta palavra; e, no caso afirmativo, se a invenção preenche as condições da lei. No caso contrário, dissemos, a lei não é aplicável.” Concorda com tal entendimento Labrunie, Jacques: “Evidentemente, para que haja proteção é necessária a existência de invenção. Discute-se, doutrinariamente, a existência de invenção ser ou não requisito ou condição de patenteabilidade. Decorre da lógica a necessidade de invenção para, como conseqüência, tratar-se de sua proteção jurídica, ou seja, de sua patenteabilidade. Independente da discussão doutrinária ou metodológica, é certo ser conditio sine qua non para a proteção jurídica a existência de seu objeto, que, no caso da patente, é a invenção.” Finalmente, dispõe a Resolução nº 169,Diretrizes de Exame de Patentes bloco sobre patenteabilidade que”1.1 Uma invenção deve apresentar caráter técnico e realizável em algum campo tecnológico” continua dispondo que “é necessário que a invenção esteja inserido em um setor técnico, resolva um problema técnico, e possua efeito técnico. Assim é necessário que o pedido evidencie o caráter técnico do problema e ser resolvido, da solução proposta e dos efeitos alcançados”.
(11) TRIPS – Decreto No 1.355, de 30 de Dezembro de 1994, Promulga a Ata Final que Incorpora os Resultados da Rodada Uruguai de Negociações Comerciais Multilaterais do GATT.
(12) Art. 8º LPI
(13) Entende-se que por mais que o texto legal compreendido no Art. 11 §2º refira-se a novidade, trata-se formalmente de uma questão de prioridade. Não obstante, reinserimos tal disposição para fins de referência formal e sistemática sobre o requisito da novidade.
(14) Resolução nº 169/2016, Diretrizes Exame de Patentes – Bloco II – Patenteabilidade
(15) Discussão a parte deve ser considerada para pedidos de patente e patentes que descrevam em seu relatório descritivo determinado conteúdo, mas que nos os reivindiquem. Nos parece que o cenário, cada vez mais comum de ser encontrado na jurisprudência administrativa nos escritórios de patente, deva ser analisado em maior profundidade. Em primeira vista, não nos parece adequado o conteúdo descrito e não reivindicado de um pedido de patente A impedir a concessão de uma reivindicação descrita mas reivindicada em um pedido de patente B, que seja depositado anteriormente à publicação de A.
(16) CERQUEIRA, João da Gama, Tomo II Vol I, pags 60 a 62 vem a estabelecer originalmente tais critérios, mas que são fundamentados no código da propriedade industrial de Lei n 5.772, de 21 de Dezembro de 1971., motivo da atualização destes critérios para a legislação vigente.
(17) Não se deve confundir a reivindicação de prioridade, procedimento administrativo de usufruir do direito de prioridade, com a reivindicação compreendida no pedido de patente, que determina a extensão da proteção conferida.
(18) CERQUEIRA, João da Gama, Tomo II Vol I, pag 37, “Todas as invenções industriais visam a um destes fins: criar novos produtos ou objetos materiais, ou criar novos meios para se obter determinados efeitos, os quais tanto podem concretizar-se em um corpo ou objeto material (produto), como manifestar-se em um simples estado de coisas (resultado).” A aplicação nova, também já era definida como categoria de invenção por Gama Cerqueira, atualmente denominada comumente hoje de patente de uso. Entendemos aqui que no Brasil a patente de uso seja formalmente uma patente de processo escrita em forma mais cognitiva e simplificada, sem qualquer prejuízo a validade da reivindicação, motivo de não ter sido incluída como categoria de invenção neste trabalho. Faber, Robert C., 2010, define claramente este ponto explicando que: “One may not simply claim a new use for an existing object or composition, by stating the object or composition and then stating its use. A patent to an apparatus does not of itself necessarily prevent an inventor from later obtaining a patent on a new method of using the apparatus. New uses of old products or of old processes are patentable. Two examples of improper “use” claims appear in the Manual: “A process for using monoclonal antibodies of claim 4 to isolate and purify . . . interferon” and the “The use of a[n] . . . iron alloy . . . as a vehicle brake part subject to stress by sliding friction.” Use claims are common in patents in other countries. A product or process is recited in one claim. Another, sometimes dependent, claim then recites the use of the product or process for a stated purpose, or sometimes does not even state the purpose. This is indefinite and nonstatutory under section 101 or section 112. A new use claim is instead a process of using the object or composition or process, which includes steps in the process. Its preamble may only be a method claim preamble, such as “A method of [accomplishing an objective] or [use of an object, process, etc.],” with a transition like “comprising [the steps of].” The claimed process must be directed to a new use. If the claimed new use is only a newly discovered and therefore inherent result of a known, prior art process directed to the same purpose, or is directed to a result or property of the known composition, structure, or process, then the known item anticipates the new use claim. It is not a patentable new use, as it is inherent in and anticipated by the known process.”
(19) Define a Resolução nº 124/2013, Diretrizes de exame do INPI – Conteúdo 3.18 Para todos os efeitos, processo e método são sinônimos. Novamente Robert C., 2010, explica que: “The words “method” and “process” are interchangeable in the patent law, although “process” is perhaps more frequently used in chemical cases, while “method” is more usual in mechanical and electrical cases. To provide uniformity, this statutory class is now called “process” in 35 U.S.C. § 100(b) and is defined therein to mean “process, art or method.””.
(20) CERQUEIRA, João da Gama, Tomo I Pag. 141 “A patete não cria, mas apenas reconhece e declara o direito do inventor, que preexiste à sua concessão e lhe serve de fundamento. Seu efeito é, portanto, simplesmente declarativo e não atributivo da propriedade. Por esse motivo, as patentes são expedidas, em todos os países, com ressalva dos direitos de terceiros e sem garantia do governo quanto à novidade e aos demais requisitos da invenção. Assim, provando-se que a invenção não poderia ser validamente privilegiada, a patente se anula. Em suma, a patente declara o direito que porventura compita ao inventor e estabelece a presunção da existência de uma invenção suscetível de ser privilegiada de acordo com a lei. Falhando estes pressupostos, a patente não tem nenhum valor e pode ser invalidada.”.
(21) CERQUEIRA, João da Gama, Tomo I pags. 138 e 139 e notas de rodapé: “O direito do inventor não se origina da concessão da patente, nem é criado pela lei, que apenas o reconhece e declara. Não resulta do privilégio; ao contrário, o privilégio é que resulta do direito do inventor, de que constitui o conteúdo essencial. Do mesmo modo que o proprietário goza de um direito quase absoluto sobre a coisa que lhe pertence, direito oponível erga omnes e exclusivo de qualquer pessoa, assim também o inventor goza de direito análogo sobre a invenção, durante o prazo fixado na lei. O conteúdo positivo desse direito é o uso ou exploração do invento. Seu conteúdo negativo é a exclusão de outras pessoas, pois todo o direito, como poder de ação, é exclusivo dentro de sua esfera.330 Reunindo esses dois elementos, temos que o conteúdo do direito do inventor consiste na exclusividade do uso e exploração do invento, o que constitui o privilégio assegurado pela lei. Estabelecendo a distinção entre o privilégio do inventor e os monopólios de indústria ou de comércio, escreve WALKER: ”The exclusive privilege granted to an inventor by contract, is not, as generally understood, the exdusive right to make, use, or vend the patented invention butf on the contrary, is the right to exclude others from making, using, or vending the invention ofthe patent” (op. cit., vol. I, pág. 27). Ora, o direito exclusivo de fabricar, usar ou vender implica necessariamente no direito de impedir que outros fabriquem, usem ou vendam. E a mesma coisa. Aí não se encontra propriamente a diferença entre o privilégio do inventor e os monopólios, mas os dois aspectos do direito, positivo e negativo, que também se encontram nos monopólios, cujos titulares também possuem o direito de explorar seu objeto com exclusão de outros. O que distingue o privilégio do inventor dos chamados monopólios é que aquele constitui o reconhecimento de um direito, ao passo que os monopólios são direitos meramente concedidos pelo poder público, abrindo exceção ao direito comum.”.
(22) Tal dispositivo reforça o entendimento sobre a natureza jurídica sui generis da propriedade intelectual quando se refere às patentes de invenção, possuindo aqui, parcialmente, natureza de bem imóvel. PEREIRA, Caio Mário da Silva dispõe sobre instituto similar, no Código Civil brasileiro, a passagem forçada: “O preceito (Código Civil, Art. 1.285) assegura ao dono do prédio que não tiver acesso à via pública, nascente ou porto, mediante pagamento de indenização cabal, constranger o vizinho a lhe dar passagem, cujo rumo será judicialmente fixado, se necessário. Para ter direito à passagem forçada, exigível diretamente ou em Juízo, é requisito básico o encravamento. Somente o prédio sem saída para a via pública, nascente ou porto tem. Não bastam razões de comodidade, nem o vizinho tem de suportar o encargo da passagem para melhoria das condições de acesso àquelas serventias. Assim, pois, se o prédio for dotado de saída, por muito má que seja, não se qualifica como “encravado”.”. Caio Mário da S. Pereira – Instituições de Direito Civil – Vol. 4 – Direitos Reais (2014).
(23) Seu relatório descritivo detalha suficientemente o conteúdo para fundamentar as reivindicações.
(24) Questionamento caberia sobre se a área acima de 3B poderia vir a ser concedida conjuntamente com o objeto reivindicado em 3B, apesar de não ter sido reivindicada originalmente com o depósito do pedido de patente “B”. Teoricamente sim, supondo que haja fundamentação no relatório descritivo do pedido de patente poderia haver pleito, durante o processo administrativo e em ciência Ex post facto da existência do pedido de patente “A”. Na ausência de fundamentação haveria condição para seu pedido como reivindicação mas não haveria suporte legal ao pleito. Recomenda-se sempre que o redator de patentes realize uma análise mental sistemática sobre os cenários possíveis de ocorrer durante o processo administrativo de concessão e eventualmente até em processos judiciais. O desenho de posições de recuo tanto nas reivindicações como no relatório descritivo é sempre recomendado.
(25) Labrunie, Jacques, Invalidade por infração a direitos de terceiros pag. 101
Bibliografia:
CERQUEIRA, João da Gama. Atualizado por: Silveira, Newton e Barbosa, Denis Borges. Tratado da Propriedade Industrial. Vol. I, Parte I. Da propriedade Industrial e do objeto dos direitos. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris. 2012. 2ª tiragem. 398 p.
CERQUEIRA, João da Gama. Atualizado por: Silveira, Newton e Barbosa, Denis Borges. Tratado da Propriedade Industrial. Vol. II Tomo I. Dos privilégios de invenção, dos modelos de utilidade e dos desenhos e modelos industriais. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris. 2012. 2ª tiragem 408 p.
FABER, Robert C. Faber on Mechanics Patent Claim Drafting. Practising Law Institute (PLI); Sixth edition. 2010. 900p.
GARCIA, Balmes Vega. Contrafação de Patentes, LTr, 2005. 112 p.
IDS-Instituto Dannemann Siemsen de Estudos de Estudos Jurídicos e Técnicos. Comentários à Lei da Propriedade Industrial. Rio de janeiro: Renovar. 2013. 3ª Edição. 584 p.
LABRUNIE, Jacques. Direito de patentes: condições legais de obtenção e nulidades. Barueri, SP: Manole, 2006. 185 p.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil, Volume IV, Direitos Reais. 22ª edição. Rio de Janeiro: Forense. 2014. 384p.
PHILIPP, Fernando Eid. Patente de invenção: extensão da proteção e hipóteses de violação. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006. 200 p.
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